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domingo, 12 de junho de 2011

Sinais

Para Eduardo Nasi

Alex Cross' Julia | Oil on paper | 17" x 23" | 2006

Não leio horóscopo, mas a secretária lê em voz alta. Todos os dias, Martina grita de sua mesa as influências ou grandes predições. Quando saio viajar, Martina manda mensagem para meu celular. Já disse que isso não me interessa, mas ela segue:

— Doutor Eduardo, o senhor fique atento, hein? Olha só: Urano continua pedindo abertura e trazendo novidades em sua carreira e vida profissional.

— Doutor Eduardo, o senhor não vai acreditar! Olha só: Plutão vibrando! Construção e criatividade fazem parte desse período. Bom dia pra reunião com o Doutor Marcos, né?

Martina encontra coincidências em tudo.

Hoje pela manhã, ela registrou o seguinte: “Doutor Eduardo, o senhor abra os olhos, hein? Em uma viagem ou em uma reunião com amigos você pode conhecer alguém que vai mexer com seu coração”.

Não discuto com Martina porque ela sobra. Por exemplo, ela me conseguiu hotel mesmo nesse horror que está a cidade. Olha, impressionante o efeito de uma conferência mundial, fico imaginando como será na Copa.

Pensava nisso justamente na hora da entrada, quando assino o papel de registro do hóspede. Dispenso o carregador e subo ao quarto com minha mínima bagagem.

No elevador observo que está escrito 72 no cartão.

— 72. — não percebo, mas digo em voz alta.

— Como, senhor? — replica o ascensorista.

— Ano do meu nascimento. Aqui, escrito na chave.

— Boa sorte, hein?

— Ah, se você diz, deve ser.

Encerro o diálogo estilo Martina com um sorriso forçado.

Atravesso o corredor já com o rosto exausto das conexões. Assim que abro a porta, deparo-me com uma senhora de rolos no cabelo. Penso primeiro que: minha nossa, ainda usam essas coisas na cabeça. Depois é que realizo: a dona está mesmo é no meu aposento. Confiro o número na chave, recuo e avisto a sinalização no marco. Confere: 72.

"72, e ela poderia ser minha mãe mesmo".

— O senhor não se preocupe, estou de saída. Mudei de quarto.

— Ah, sim, pois é. Achei estranho, mas...

Ela arasta sua mala devagar.

— Precisa de ajuda?

— Não, pode deixar, a vida é um parto sozinho.

— O quê?

— Nada, nada.

Ela conseguiu aumentar sua lentidão. O penhoir cor-de-rosa de gueixa aposentada.

A despedida nem virou livro porque tocaram a campainha. O rapaz da manutenção também parecia lento, era coxo, o que deveria aumentar o valor da sua gorjeta:

— Senhor, vim arrumar o banheiro.

— O banheiro?

— Sim.

Banheiro estragado. Aproveito a deixa e desço à recepção para que me troquem de quarto.

— Ah, pois não, senhor, sentimos pelo inconveniente.

O Recepcionista me entrega o novo salvo conduto, eu estava quase triste por abandonar meu nascimento.

Mas a indicação recente apontava 39, 3° andar. Engasguei. Agora era o ano de nascimento de minha mãe morta. Martina ficaria louca com os sinais.

Quando abro a porta encontro novamente a mulher de bobes, agora já sem bobes, totalmente nua, ainda de rosa, de quatro.

Freud não existe.

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