Para Bito, Miguel e Fernando Malheiros
O pai levou os meninos para visitar Jacinto. O doutor vivia em magnífica residência no bairro Petrópolis. A arquitetura exterior, eficiente e didática, informava ao público a boa saúde bancária da família: portas de madeira maciça eram sobriamente entalhadas e guardavam quatro metros de altura; pontas nas grades largas enfrentavam o céu e pousavam gárgulas sobre as esquinas. Sim, até gárgulas havia. Uma mansão.
Bito e Migue pequenos, mais mirrados que os cães do pátio, entreolharam-se no banco de trás do Monza azul tilintante de novo: os portões abriram sozinhos! Melhor, abriram mecanicamente. Um espanto.
Uma entrada, no mínimo, triunfal: o caso era que a casa mais parecia uma fábula. Uma fábula terrível de vampiros ou zumbis ou monstros. Sim, uma monstruosidade de construção assusta a gente.
Os pais grandões e sabidos de leis e do universo deixaram seus guris à solta: partiram para a biblioteca, evidentemente — local apropriado para conversas grandes e sérias.
Fernando viu-se encarregado de ensinar a propriedade aos convidados. O meninote riu simpático aos já amigos. Foram-se correndo de fome para aventuras.
O terreno emparelhava em grandeza: campo de futebol, quadra multiesportiva e jardins. Não bastasse o país de terra e grama, a piscina tomava banho de sol feito uma rainha. O deck, feito trono, erguia a majestade: coroada com cascata de pedras e folhas largas como a amazônia. Mas o esplendor iluminado doía porque era maio. Quem suportaria ficar molhado quando as nuvens piscassem o sol?
Foi quando o anfitrião alcançou a santa de todos os meninos, a bola de futebol. Reverenciaram a redonda mater e então se foram a gastar as horas da tarde.
Jogaram e bufaram tanto que venceram o outono friaco do sul e suas correntes ardidas. Bito e Miguel tinham telepatia e a única sede que contava agora era a da água infinita e azul da piscina, com seus diamantes líquidos.
Voaram como quem plana ao suor do vento rumo ao banho redentor. Lançaram-se como porcos magros, era de se estranhar a cena.
Parado ficou Fernando: fitando. Bito batia os braços e pernas e dava gritinhos contentíssimos. Migue, ao contrário, silente como farol, duro, reto, vertical. Foi-se afundando e não voltou.
Bito nada viu, mas Fernando parece que entendeu, quem sabe a piscina sussurrou. Jogou-se atrás de Migue e resgatou seu corpinho até a margem.
— Não viu que era funda? — berrou o salva-vidas.
— Vi.
— E então? É louco?
E mais gritando uns tantos palavrões enquanto o miúdo tremia e Bito se apagava.
De volta ao Monza, encharcados de revolta paterna, viajaram mudos. Bito triste da pouca vida. Migue decepcionado da pouca morte.
Êêê, lapidado!... Que bonito, Cín. Beijo, beijo!!
ResponderExcluirBah, tô loco pra dizer um palavrão; mas vou me conter. Curti pacas.
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