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sábado, 12 de dezembro de 2009

Mulher-melão



Não tivemos um primeiro encontro. Quando saímos pela primeira vez, não foi sequer com exclusividade. Não veio me buscar em casa. Não pude conferir se era do tipo que buzinava ou vinha até a porta. Não ligou antes para marcar e garantir a disponibilidade. Não agendou com a sorte. Quando saímos pela primeira vez, eu estava era chegando em casa.

Recebi um torpedinho dele dizendo assim: estou com um amigo em um bar. Interessa? Respondi que interessava, sim. Onde era? E fui para lá, praticamente uma colisão casual, alguém com quem topamos na esquina, como-vai-tudo-bem, vamos tomar alguma coisa e botar o papo em dia.

Não fui armada, nem montada, nada. Usava tênis e calça jeans. Não mascarei nem os cílios. É porque não era um Encontro, assim, com letra capital.

Cheguei lá em alguns minutos. Os rapazes estavam sentados em uma mesa perto do bar, bem descontraídos. Cerimônia zero: praticamente não levantaram quando cheguei.

Foi contando que recém saiu da aula logo ali na frente. Eu achei tudo muito divertido e solto. Tomavam um bourbon. O tal amigo pareceu muito gentil, até mais simpático do que o próprio autor do convite.

Aliás, para dizer bem a verdade, meu anfitrião, se é que posso chamá-lo assim, parecia de pouco caso comigo.

Riu a plenos pulmões só porque eu disse que gostava de Maria Bethânia. A troça teve até direito a careta e explicação professoral sobre um tal bethanismo de que nunca tinha ouvido nem o cheiro. Ficou bufando de riso quando eu reafirmei minha fé no Diamante Verdadeiro e confessei minha emoção com Vinícius.

A seguir, debochou com gorduras só porque eu seguro o brinco às vezes para falar. O encadeamento da conversa parecia mais a implicância de meu colega Thomas na escola, aquele que me chamava de nerd e teimava que eu mordia toda a tampinha da caneta.

Perto das onze horas, o amigo levantou já saindo, tchau e prazer até mais. Eu fiquei estaqueada na cadeira do bar, afinal, meu plano de sair à francesa tinha acabado de sofrer seu dia D. Danou-se.

Pensava em como poderia continuar falando com o cara, afinal, já estava me sentido a mais debilóide bethanista, ridícula, insegura, que não consegue controlar as mãos com a voz. Era pra ser filosofia de balcão, ou um flerte modesto, quem sabe. Alguém para eu ser fã por uma noite. Eu via meus oito anos de análise ameaçados – o troço estava acabando com minha auto-estima.

Eu pensava nisso e olhava os lábios dele se movendo enquanto falava quando, de repente, ofereceu o dedo indicador e disse assim: morde.

- Como é?

- Morde. Não tem coragem?

Que doido. Está bem, mordi. Ele disse que eu mordesse mais, como se fosse a fruta preferida, aliás, qual era minha fruta preferida, eu disse melão. Ele fez uma cara de quem tinha achado algum sentido oculto nesse fato, um ar de eu sou o primeiro, eu sou mais leve, eu sou mais eu.

E foi aí, justamente aí que a ficha caiu. Morder dedo? Bem estratégia de galã de rodoviária. Faz isso com todas: pega a moça na saída do trabalho com sua CG 125 consorciada. Para livrar a garupa, apenas remove a caixa do China in Box. No caminho, encoxa a menina no muro da sorveteria e manda morder o indicador como se fosse um eskibon.

Tudo tinha sido um esquema muito bem bolado. O cara me chama, faz de conta que é uma coisa menor, um clima Jair Rodrigues de chega aí, passa a noite minando minha autoconfiança, o canalha, para de repente levantar minha estima e me fazer provar que era bem melhor do que ele – algo que não era difícil.

Ah é? Deixei ele dar o show. Fiz de conta que nem percebi. Ele era apenas um ator. Mulher gosta mesmo é de amadores.

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