No vestiário da academia todo mundo faz de conta que é íntimo. Não sei se é intimidade ou embaraço. Seja porque porque dividimos a pia, seja porque é preciso cuidado para não escorrer no piso úmido. São flashbacks do banheiro da família. Um chuveiro estragado então, e já somos amigas de infância.
As conversas costumam ser forçosamente partilhadas, como o parabéns a você do restaurante - é um desrespeito não participar.
Subitamente somos dragados à piada do momento. Não dá pra ficar imparcial. Ou fingir que não é com a gente. A nudez cria uma atenção extrema.
Nesse ambiente de pressa e timidez, colocava pomada na tatuagem nova. Louca para fechar a mochila e me ver inteira. A vizinha de armário não deixou, já saiu confessando:
- Não tenho coragem de fazer uma dessas.
- Ah, é? Tem medo da dor?
- Não, é que eu tenho um filho adolescente. Não quero que ele pense que está liberado.
- Tudo que disser será usado contra você no tribunal?
- Hahaha. Certamente. Sabe, eu nem bebo.
- Nunca?
- Não é isso, eu bebo com as amigas, mas nunca na frente dele.
Levar a sério a questão do exemplo na frente de um filho é ferir o DNA. Passamos a ser o modelo de grande mentiroso. Pensa que o filho não descobre? Não vê? Aprende que a verdade é injusta. Importante é aparentar. A naturalidade não serve, é inútil. Não ouse ser espontâneo. Não ouse abrir seus defeitos.
O moralismo asfixia. Nada como a perfeição para criar traumas. O filho vai pedir distância para cometer suas gafes e crises longe do lar.
A criança viverá em cárcere privado nos próprios pensamentos, indecisa entre o fingimento e a felicidade.
A relação desgasta. E mais ainda se ela se impuser um papel, uma imagem a ser perseguida e cumprida. Será desagradável, como participar de evento social permanente, como se nem em casa fosse permitido remover a maquiagem e permitir a pele respirar.
A conduta da mãe não tem tanta importância assim como ela gostaria que tivesse. Pensar assim empresta grandeza, imaginamos que depende de nós para que tudo vá bem com o filho.
Dizemos que o adolescente mente, nós é que começamos mentindo antes.
Mas não era eu quem diria tudo isso para ela. Que ela vista a carapuça sozinha. Faz frio lá fora.
As conversas costumam ser forçosamente partilhadas, como o parabéns a você do restaurante - é um desrespeito não participar.
Subitamente somos dragados à piada do momento. Não dá pra ficar imparcial. Ou fingir que não é com a gente. A nudez cria uma atenção extrema.
Nesse ambiente de pressa e timidez, colocava pomada na tatuagem nova. Louca para fechar a mochila e me ver inteira. A vizinha de armário não deixou, já saiu confessando:
- Não tenho coragem de fazer uma dessas.
- Ah, é? Tem medo da dor?
- Não, é que eu tenho um filho adolescente. Não quero que ele pense que está liberado.
- Tudo que disser será usado contra você no tribunal?
- Hahaha. Certamente. Sabe, eu nem bebo.
- Nunca?
- Não é isso, eu bebo com as amigas, mas nunca na frente dele.
Levar a sério a questão do exemplo na frente de um filho é ferir o DNA. Passamos a ser o modelo de grande mentiroso. Pensa que o filho não descobre? Não vê? Aprende que a verdade é injusta. Importante é aparentar. A naturalidade não serve, é inútil. Não ouse ser espontâneo. Não ouse abrir seus defeitos.
O moralismo asfixia. Nada como a perfeição para criar traumas. O filho vai pedir distância para cometer suas gafes e crises longe do lar.
A criança viverá em cárcere privado nos próprios pensamentos, indecisa entre o fingimento e a felicidade.
A relação desgasta. E mais ainda se ela se impuser um papel, uma imagem a ser perseguida e cumprida. Será desagradável, como participar de evento social permanente, como se nem em casa fosse permitido remover a maquiagem e permitir a pele respirar.
A conduta da mãe não tem tanta importância assim como ela gostaria que tivesse. Pensar assim empresta grandeza, imaginamos que depende de nós para que tudo vá bem com o filho.
Dizemos que o adolescente mente, nós é que começamos mentindo antes.
Mas não era eu quem diria tudo isso para ela. Que ela vista a carapuça sozinha. Faz frio lá fora.
Ouça esta Crônica Falada no rádio,
programa Talk Radio, da Katia Suman
(arraste a rolagem para os 35'50")
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