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domingo, 6 de março de 2011

Conficções: o doce veneno do escorpião.

EPITÁFIO

Por dentro dos cabos
estavam os nervos.





Bitols é tão espirituoso que às vezes desejo que desencarne. Ambos sairíamos ganhando: ele estaria com os seus e eu ficaria livre de assombração.

Sou uma pessoa com alguns conceitos. Não acredito que seja fácil conviver comigo, chego a ter obsessões com algumas palavras, termos que signficam isso ou aquilo:

- Responsabilidade, grandiosidade, culpa.

Em resumo: eu falo um dialeto.

Não aconteceu de graça, não foi de uma hora para outra: são frutos dos anos de consultório e de trabalhar com a psico-análise. Acabei abraçada em algumas âncoras.

Por exemplo, não economizo em aplicar “loucura”, “fiquei louca” ou “louco”. Não uso como quem aponta um crime, mas também não lanço à toa, como um xingamento. É mais um diagnóstico simples, para lembrar a mim e aos meus que a gente visita a completa desorganização várias vezes ao dia.

Quando digo que “acho que isso está adoencendo teu filho”, “mentir assim é de enlouquecer qualquer um” estou falando sério. Bitols não gosta nem um pouco. Acha um saco, na real, o plantão selvagem e gratuito.

Tá bem, é xarope. Mas xarope nasceu para aliviar a tosse. Vou usar minha medicina especialmente com os que amo. Não topo assistir um deles se envenenando de risólis frito em óleo cancerígeno e não falar nada. Isso é negligência. O mesmo vale para quando vejo Bitols encobrindo que um filhote não deu a descarga. Acho “super-pai” o Ó.

Caçoo e chamo de Bob pai e Bob filho.

Deve ser um porre a presença de um padre cerceando os pecados, vai ver que é por isso que não casam e nem têm filhos. Adoro um púlpito e mereço a chacota; mas também ajeito as feridas, os arranhões, presto para indicar pomadas, prescrever comprimidos, tratar cólicas e dermatite seborréica.

Por isso é que fiquei fula, mas fula mesmo, quando o Bitols foi num programa de TV aberta praticar um dos seus retanches de escorpiano. 

Ah, eu estou sabendo que ele não tem compromisso com a saúde de ninguém, que está nessa vida pelo melhor do texto. Ele vai sacrificar qualquer compromisso com a verdade em nome do grande efeito. Já senti na pele - precisamente porque ele é genial no convencimento. Na hora do romance, nada supera seu discurso. Na hora da discussão, é um orador de primeira. Briga de cachorro grande, como descreveu minha cunhada.

Ele criou um gênero que se chama Conficção: parece confissão, mas é ficção. Ninguém sabe a diferença. Nem ele. É que o leitor quer alguém que viva, não apenas alguém que escreve bem. Bom autor está para ser um gêmeo, um tradutor da emoção. E ele faz isso como ninguém.

Outra coisa que ele faz como ninguém é dar o troco:

- Não era qualquer programa.

Era justamente o Camarote. Sim, aquele que participo todas as semanas fazendo a Crônica Falada. Meu sangue cozinhou as hemáceas enquanto engolia a paródia.

O santinho-do-pau-oco sentou no sofá na frente das câmeras e abriu a tramela discursando da importância de reclamar. Justo reclamar! A pior coisa - o modo mais rápido para ficar paralisado diante das coisas e mentindo que está fazendo algo a respeito. Um dos meus pontos chaves.

Foi golpe baixo e não parou por ali: saiu incrementando e disse que o amor é um pouco doença, que excesso de saúde adoece. E as pessoas no estúdio meneando a cabeça, rindo, achando bonito aquele monte de barbaridade. Ninguém nem imaginava que estava participando de um complô. Foram aliciados como todo o público que viu e que se sentiu legítimo na preguiça de melhorar a própria vida.

- Ui, que ódio de vingança velada!

Convenhamos: não quer ajudar, não atrapalha. Fiquei doente de raiva, esverdeada. No fim, isso aqui não deixa de ser também um revide. Pelo menos eu chamo de Matando Carpinejar.

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Confira aqui a famigerada entrevista.

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