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quinta-feira, 19 de maio de 2011

E depois voar no azul/ Cruzar de norte a sul/ O céu e o mar.

EPITÁFIO

Na infâcia, guardava
uma pena de ganso no estojo.




A melhor coisa do universo é viajar junto com nosso amor. E não existe companheiro de viagem como o Bitols.

Nada a ver com o George Clooney do Up in the air (ou Amor sem Escalas): Bitols não faz o tipo prático, apesar das milhas de milhas acumuladas. Ele é mais o sujeito populista: suas filas no detector de metais, por exemplo, imitam as do SUS ― centenas de pessoas aguardam a remoção parcimoniosa do relógio, dos anéis, do cinto, dos sapatos ou dos suspensórios. Ainda somando contra a praticidade, suas malas pesam como se carregassem um cadáver e as viagens são tantas e tão curtas que dão nó nas pernas. Parece desagradável, mas não é. Não tem companheiro de viagem como o Bitols: ele se supera.

Cheio de gracejos, é mais conhecido que o Lula em aeroportos. Faz piadas com carregadores, porteiros, jornaleiros. O bom humor contagia a todos. Os óculos tipo mosca coloridos, a fala esquisita, as roupas lindas de escândalo: tudo favorece.

Tem mais: traz no mínimo cinco livros, sempre emprestando o que eu pedir. Às vezes, algum ganha carona só porque ele pensa que eu poderia querer. O laptop vai de bateria cheia e com filmes para vermos juntinhos dividindo fones de ouvido. A conversa é a melhor que existe, se a onda for de bate papo. E pra dormir, é o ombro mais cheirosinho, especialmente agora (Bitols completou vinte semanas sem cigarro).

Claro, tem a chatice de avião brasileiro. No último trecho, por exemplo, nosso voo era pra durar uma horinha. Mas aí é tudo lenda: demorou pra sair e, quando finalmente saímos, terminamos dando voltas pelo céu e aterrissando em Floripa ao invés de Porto Alegre.

Dentro dessa maratona, depois de dormir e ler e fazer tudo o mais possível pra evitar  o horror do banheiro da aeronave, não me restou outra saída: fui encarar o cubículo hiperaproveitado.

Quando voltava ao assento, vi que Bitols não estava.

E não vinha, não vinha... Ué?

Dali a pouco chegou o faceiro, rindo, abanando com as duas mãos. Olhei bem, tinha uma mancha preta bem em cima do... Bem, por sobre a braguilha das calças vermelhas estava uma roda preta de tinta.

― Que é isso, Bitols?

― Bah! Vazou a caneta, fui lá tentar limpar.

Então passou a aeromoça loirota, toda florescente e folgada:

― Como é que ficou? Borrei muito?

Come again (ou Cuméquié)?

Como assim "borrei muito"? Sério. Cinco minutos urinando. Um simples xixizinho. E o Bitols já estava de kikiki-cócócó com a copeira do ar?  Já imagino o projeto de governanta aérea esfregando a zona pubiana do Bitols.

Aí sou compelida a me agarrar na poltrona, torcer pra que ela flutue e facilitar a saída de emergência.

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Este é o filme do Clooney


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Leia aqui a versão de Bitols sobre o dia da caneta estourada:

Eu senti o apego durante um voo de volta a Porto Alegre. Estava com um terno cinza, retrô, escrevendo no caderninho e, de repente, a caneta estourou. 

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