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terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Paternagem

Constanze Moll´s artwork


Quando cheguei, já estava.
Não latia a não ser para avisar
de movimentos estranhos nos roseirais.

Não gemeu jamais nunca
nem mesmo com anzol fisgando as carnes,
nem mesmo com ovas, larvas, bernes,
nem mesmo na fome da tigela ensebe,
nem mesmo no sufoco tinto do pátio.

Podia andar nele como um cavalo,
um camelo negro, orfeu
de minha infância

Suportava aos pêlos
Até que puseram
seu filho no mundo.

Desengonçado, cria arredia:
fugia, atacava, mordia,
sangrava bergamotas,
colhia gritos nervosos dos passantes,
sofria pontapés e chuva de coices.

O pastor pagava tudo no corpo.
Não teve crédito
para a dor fora de si.

Meu cachorro morreu de paternidade.

Um comentário:

  1. Que texto mais lindo, Cinthya, imagens tão fortes, que combinam com o universo desses ex-lobos. Adorei mesmo!

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