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quarta-feira, 10 de março de 2010

O Suicício de Highlander

EPITÁFIO
Via dança e poesia
nas roupas do varal.



Drão, o amor da gente é como um grão
Tem que morrer pra germinar.
Gilberto Gil

Fabrício terminou comigo. Pela terceira vez. Terminou com berros, pediu para que eu descesse com suas coisas. Passava da uma da manhã. Faço questão de escrever sobre isso, assim empresto companhia a mim mesma (porque me senti uma palerma).

Nossa relação é intensa e divertida, ele é um quatro-em-um de gentilezas. Fabrício veio com bateria de lítio ultra-leve. Está sempre bem-disposto, sempre bem-disposto, sempre bem-disposto, sempre.

E eu, não.

Na noite fatídica, por exemplo, passava da meia-noite e eu ainda estava trabalhando. Foi aí que ele ligou.

A boiada estourou quando eu não mandei um torpedo avisando que estaria ocupada, para que ele não se sentisse rejeitado. Eu nem pensei nisso, esse tipo de coisa jamais me ocorre. De modo geral, imagino que o outro vai dar um jeito. Eu desisti há muito tempo de granjear elogios pelo excesso de cuidados ou parcimônias. Talvez isso tenha vindo com a medicina, embora não esteja me livrando da responsabilidade. Mas não vejo que isso seja falta de conectividade, apenas não penso o mesmo que ele.

Pior que isso: eu vinha pedindo a chance de brigar. Quero brigar e não falar mais hoje, amanhã retomar a conversa com o sono bem cumprido de escudeiro. Quero desligar antes de arranhar o disco. Quero pousar a xícara no pires para esfriar o chá.

De novo, ele não deixou. Sei que não é maldade, está mais para temperamento. Mas o fato é que assisti ao avassalador final da relação sabendo que iria se arrepender. A dúvida pesava sobre mim: e se eu não quisesse embarcar novamente? E se meu santo fechasse a conta? E se a aposentadoria viesse precocemente com a demissão?

No outro dia, recebi o torpedo dele requisitando itens específicos para a devolução. Coisinhas que eu não tinha reunido na madrugada. Camiseta do Inter, camisa da Cavalera, umas meias, uns troços.

Sonhei que quando ele chegasse, estaria com a laçada armada: enforcaria o diabo sacada afora.

Melhor que viver sem ele vivo, seria viver com ele morto.

Os restos de um amor pela casa estremecem a febre. Fervi durante cinco dias. Ele , por sua vez, já estava mais que pronto para voltar. Fabrício, além do lítio, tem adamântio por dentro. É meu Wolverine particular. Sempre bem-disposto. Consegue morrer tantas vezes quantas o amor precisar.

Eu, não.

Mas sou uma assassina de mão cheia.

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