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sexta-feira, 22 de abril de 2011

Debaixo dos Caracóis

EPITÁFIO

O cimento não pergunta
o tamanho do pé.



Sempre admirei o processo criativo de Bitols. Leva menos de uma hora para escrever uma obra de arte.

No início, surpresa, pedi explicações do superpoder. Com naturalidade, respondeu que ir ao computador é a última coisa. Primeiro mastiga a ideia, namora sentenças, vivencia os conceitos, testa os ditos com amigos, com familiares, com o público em geral; depois registra as orações. Dorme sobre o assunto, acorda para a literatura. Quando chega a hora de derramar sobre as teclas, é muito veloz de chuva, basta digitar o que está pronto para servir. Depois, é só revisar, trocar repetições: filigranas do papel.

Incrível mesmo e é verdade. Todo o tempo caçando temas, paquerando novidades, bebendo história alheia, sugando piadas e reviravoltas. E digitando exageros, claro. Bem a seu estilo próprio.

Esses dias mesmo, contou que a editora da revista telefonou pra dizer que seu texto sobre a Gisele estava exagerado.

- Exagerado?

- É… Disse que estava meio demais.

- Hum.

Então fui conferir o tal artigo. É coisa de sete ou oito mil caracteres.

- Levou quanto tempo pra escrever, Bitols?

- Ah, umas duas ou três horas.

- Que the flash, hein?

Então fiz um cálculo rápido de quantas noites mais ou menos o Bitols vinha dormindo, comendo e respirando a Gisele pra permitir a formação da calamidade pública que é aquela coluna: deu uns dois séculos de punheta.

Sério. Nenhuma namorada no mundo deveria saber o que seu namorado realmente pensa sobre a Gisele. Eu sei que ela é linda e tals, não está em discussão a formosura da estimada conterrânea.

Mas uma coisa é saber que ele acha a alemoa deslumbrante em adjetivos gerais, sem maior gravidade. A questão é quando a gente descobre que outra mulher é sua diva, seu mantra mais demorado na língua.

Não é que o Bitols nunca tenha escrito sobre mim na Cláudia, sejamos justas. Verdade que publicaram uma cartinha de amor “coisa mais amor” que fez pra mim. Pouco mais de mil caracteres, bem gracinha, contando que gosto da Fafá de Belém.

Mas é que a Gisele do Bitols “é a perfeição da poesia superando o resultado da lógica”; “é a saudade de uma vida simples. Uma vida descomplicada. Sem censuras e ameaças”; “ela não é tudo, pode ser tudo, que é muito melhor”; “é o ideal do cotidiano. É a exuberância do comum”. E complementa: “Gisele Bündchen exige mais e mais atenção e não enjoamos”.

E muito mais você encontra na declaração explícita que o meu namorado fez para ela na revista feminina mais vendida do país.

Tudo bem: a gente tem que viver com as divas paralelas na vida deles, tá certo que sobre para elas todo esse sonho enquanto a gente suja a louça em casa.

Sobrevivi à leitura. Mas ele não.

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