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terça-feira, 20 de novembro de 2007

Ele

Não gostava da cara dele.
Desde pequena, falava mal.
Escreveu poesias sobre seu mau caráter;
sobre como seduzia conhecidos seus, familiares, independentemente do sexo, a serem diferentes do que eram em alma.
Achava tudo que circundava sua presença repulsivo.
Ela pensava nele o inimigo dos bons costumes, o anti-cristo.
E pensava em como tudo seria melhor sem ele.

Mas pensava nele - assim, de canto.

Uma época negou sua existência.
Durante alguns anos, viveu como se ele nem existisse.
Deu-lhe sua indiferença porque pensou que esse seria o pior castigo.

Mas acreditava que o estava castigando - assim, de ladinho, mas junto dele sempre.

Depois disso, teve cólera.
Repugnância, raiva e dor.
Por que a presença dele era tão contínua em sua vida?
Por que ele existia!? Por quê!?
Mas ele ia ver (pensava ela), ele ia ver só com quem estava se metendo.
Pois iria dominá-lo!
Iria controlar suas idas e vindas, por onde andava, com quem andava... Iria observar seu comportamento e catalogar tudo! Fez um diário e uma planilha.
Pois fez de tudo.

Até que um dia...

Como o despertar silencioso e morno do sol daquele dia - sentiu.
Não era mais raiva, nem ódio, nem nojo. Era um sentimento suave de companhia.
Olhou, simplesmente e viu.
Ali estava ele, exatamente onde ela o deixara - onde o tinha vigiado:
- melhor que guardado embaixo do colchão - ela pensou na época.
Colorido, singelo - uma paixão.
E ele esperava quieto, como sempre,
na cabeceira da cama,
debaixo do velho buda de gesso.

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