....

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Era uma vez, ela sentada na platéia do teatro.
Apoiou as mãos no colo e sentiu o ventre vibrar. Por um segundo, imaginou que fosse ele ao telefone.
Não era.
O corpo dela era que chamava por ele.

Era uma vez, ela sentada, deitada, imprimida, constrangida ao corpo de um outro numa invenção de passar o tempo, com o tempo que não tem volta. Araram a terra um do outro para cultivar o solo. Mas ela já tinha, já era fecunda, já tinha árvore dentro dela crescendo. Ela nem sabia ainda. Isso era antes.

Era uma vez, ela chorando enquanto escrevia.
Não chorava desesperada:
- pura pobreza de alternativa para expressão.
A mensagem, recém chegada à segunda-feira, era lenço e convite ao choro.
Mulheres que, como ela, esperam, sabem. Pode-se contar como é ansiar sem alívio, descrever que é o querer, dizer como é confiar no deságue, entupir-se de tempo, os minutos enfileirados, sangue congesto na veia cava a dilatar o fígado, o horror de plasma e líquido enchendo a barriga (e o choro, meu deus, o choro paracentésico que não vem), mas o sentimento envolvido é solidão de sonho.

Era uma vez, ela se sentindo um planeta em que mudou a força do campo gravitacional.
Ela, vendo estranheza ad continuum.
Tentando em vão se reconhecer.
Partiu pra aceitação e choro (falta de opção, como vês).

Era uma vez, ela lendo tão logo escrevia para ouvir o eco.
Era uma vez, ela em prece: quero te ouvir de novo dizendo que conversar comigo faz eco.

Era uma vez, ela sem poder dar outro nome: sentia pavor.
Não era mais ela mesma, nem era ainda quem seria.
Flutuava na possibilidade: uma instabilidade que não (re)conhecia.

Era uma vez, uma única vez que era de novo. Um instante dentro dela em looping.
Era uma vez, o dia em que ele lavou seu rosto.
Deslizou a mão e, como se fosse mágica, fez espuma de tudo que era ela.

Nenhum comentário:

Postar um comentário