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sexta-feira, 17 de outubro de 2008

As Mãos do Meu Pai (ou Por Favor, não conte ainda para Valentyne.)

As mãos do meu pai tinham um cheiro próprio, pecúlio, misterioso
E eu sabia dele só de fechar os olhos
Um pouco cítrico, um pouco seco, um pouco mágico.
As mãos vinham cheirando, recém saídas do hospital
Frescas como folhas
Dançando ao lado das calças brancas
As mãos de que ele cortava as unhas com cortador
Sentado e com a pasta no colo se fazendo calha para a chuva ungueal
No final passava a lâmina no contorno da ceifada
E amansava a asperez.
As mãos do meu pai,
mornidão.
E as peles dos nós dos dedos têm pregas pouco frouxas.
(Naquele tempo)
Íamos à igreja e brincávamos pinçando a pele dos dorsos e balançando
(balançando, balançaandoo, balançaaaandoooo, caiu!)
E nunca cansamos de comparar as palmas
A minha e a dele têm pintas
Prova cabal da paternidade ou da filiação, na nossa opinião
Não tem muitos cabelos a mão dele
É terna, tenra, e tem cheiro da minha terra
Transpira que trabalha a medicina,
Inspira eu menina que alucina
E que um dia no acaso
distraída, como quem não queria,
encontrou na sua mão o mesmo cheiro.

(era impregnado talco da luva de látex de procedimento,
mas, por favor, não conte pra minha irmã, que ela ainda não sabe)

(Feliz dia do Médico pra nós)

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